14 de julho de 2022
MPF abre caminho para combate a extorsão no preço do frete marítimo internacional
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) vai analisar denúncia de importadores sobre possível combinação entre donos de navios para formar bolha especulativa no preço do frete internacional durante a pandemia.
O preço cobrado pelo transporte marítimo de mercadorias continua muito acima de sua média histórica impactando fortemente nos preços no Brasil e no mundo.
A justificativa inicial para a escalada no preço do frete internacional foi um súbito aumento nas compras online durante a pandemia e a paralizações em alguns portos pelo mundo gerando descompasso na circulação de contêineres e maior procura do que oferta de espaços em navios.
Mas já passados muitos meses desse período mais crítico, a permanência do preço do frete cerca de 400% mais alta do que a média histórica vem levantando suspeitas de importadores de que este fenômeno possa ter componentes artificiais.
A Associação Brasileira dos Importadores e Distribuidores de Pneus (Abidip) protocolou uma representação no Ministério Público Federal (MPF) no início do ano arguindo de quem seria a competência para apurar esta suspeita.
A resposta da 3ª Câmara de Coordenação e Revisão Consumidor e Ordem Econômica do MPF apresenta a legislação aplicável, destaca que o CADE já atuou com êxito em casos semelhantes, finalizando com a informação de que a denúncia foi encaminhada ao representante do MPF junto ao CADE.
De acordo com o MPF “O artigo 36 da Lei 12.529/11 elenca algumas condutas que podem caracterizar infração à ordem econômica, na medida em que tenham por objeto ou possam produzir efeitos anticoncorrenciais (§3°), lá prevista a figura do Cartel Internacional”.
A manifestação do MPF também cita o art. 2º da Lei Antitruste. “Aplica-se esta Lei, sem prejuízo de convenções e tratados de que seja signatário o Brasil, às práticas cometidas no todo ou em parte no território nacional ou que nele produzam ou possam produzir efeitos”.
Ainda conforme este documento que é assinado pela analista do MPF Natália Cardoso “o CADE já promoveu diversas condenações de empresas internacionais com operação no Brasil, como no caso do cartel internacional de transporte marítimo de automóveis”.
Para o presidente da Abidip, Ricardo Alípio, autor da denúncia ao MPF, a suspeita de formação de cartel é bastante fundamentada. “Entre vários outros indícios, acrescentamos um relatório disponibilizado pelos Estados Unidos que aponta aumento expressivo na margem operacional de lucro das companhias de armadores, demonstrando a posição dominante de mercado que conjuntamente possuem”, disse.
Na denúncia feita ao MPF, também segue um precedente que reforçaria a suspeita e a possibilidade de condenação. “Citamos o caso da Comissão Australiana de Concorrência e Consumo – ACCC – equivalente ao CADE, na Austrália – que aplicou multa milionária por manipulação de preço de frete durante a pandemia em uma companhia de transporte marítimo chamada Wallenius Wilhelmsen Ocean – WWO”.
O transporte de um contêiner da China para o Brasil que sempre oscilou na casa de US$ 2 mil, chegou a custar US$ 15 mil no fim do ano passado e atualmente vem se mantendo na faixa de US$ 9 mil.
Concentração de mercado
Um relatório produzido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em 2018 mostra como o mercado de transporte marítimo foi se concentrando em apenas três grandes grupos. De acordo com o relatório, nos anos 90, formaram-se as alianças internacionais que funcionam como grandes consórcios de armadores. Em vez de um transportador específico oferecer o serviço, quem o faz é a aliança, usando navios de todos os seus membros alternadamente. “A consolidação deu um grande passo a partir de meados de 2017, quando os armadores passaram a se organizar em três grandes alianças. Atualmente, cada aliança é responsável por cerca de um terço da capacidade da rota Leste-Oeste”, mostra o relatório da CNI.